1 de jul. de 2018

HEREDITÁRIO E O PESO DO LUTO – CRÍTICA


Começo dizendo que Hereditário vai contra as convenções do gênero e procura subverter ao máximo o que se espera de filmes de terror modernos. Não se trata de um filme para reunir os amigos e ir tomar uns sustos em uma sessão as duas da tarde no shopping mais próximo. Se trata acima de tudo de um filme muito bem realizado, que articula muito bem as quebras de expectativa e é um perfeito exemplo de filme de estreia que nos deixa ansiosos para ver mais produções de seu realizador, no caso, Ari Aster. Dito tudo isso, vamos para a sinopse.

Após a morte da reclusa avó, a família Graham começa a desvendar algumas coisas. Mesmo após a partida da matriarca, ela permanece como se fosse uma sombra sobre a família, especialmente sobre a solitária neta adolescente, Charlie, por quem ela sempre manteve uma fascinação não usual. Com um crescente terror tomando conta da casa, a família explora lugares mais escuros para escapar do infeliz destino que herdaram.

Hereditário vai na onda dos filmes de terror de altíssima qualidade que o cinema vem lançando. A construção da trama opera de forma descendente, após o falecimento repentino da avó, a família Graham entra em uma sucessão de eventos que leva ao seu declínio, e o roteiro e a direção de Aster acertam em demonstrar como o luto e a solidão operam nos membros da família. Temos o pai (Gabriel Byrne) que é capaz de tudo para manter a integridade mental da família, a mãe (Toni Collette) que busca uma maneira de suprimir toda a sua dor de um jeito que não fique completamente maluca, o filho adolescente (Alex Wolff) que desconta sua frustração nas coisas da vida e a filha esquisita (a estreante Milly Shapiro) que mesmo após perder a avó não faz questão de ser menos fechada em seu mundinho.


A estrutura da família e de seus membros opera muito mais de uma maneira mundana do que estamos acostumados a ver no cinema em geral. O casal fechado, os filhos isolados, os jantares silenciosos e a dor gritante e ainda assim calada.
Se Hereditário causa estranhamento e muitas vezes se demonstra difícil de entender, é porque o próprio Aster não faz questão de fazer com que toda a trama seja clara desde o início. O sentimento que o público tem ao assistir é incomodo, a cada cena que dura mais do que o espectador espera é possível sentir isso, ao invés de termos o corte rápido que é comum em filmes do gênero e funciona quase como um band-aid arrancado rapidamente para a dor ser menor, temos a permanência do plano, que faz a angústia ser ainda maior e demonstra como não são necessários os famigerados Jump Scares para fazer o público ficar completamente aterrorizado.

A única ressalva é a de que no fim, o filme utiliza de uma explicação desnecessária para o entendimento completo da trama. Visto que a trama do filme é cercada de momentos que exigem de um poder de interpretação tardio do público, esta explicação acaba quebrando o divertido exercício de repassar o filme na mente para uma total compreensão da trama.
Quanto ao elenco, Toni Collette brilha com uma interpretação cheia de explosões emocionais e frases fortes, enquanto Gabriel Byrne entrega uma sutileza que demonstra o quanto seu personagem está em conflito entre sentir a dor e se manter inteiro pelo bem da família. Alex Wolff demonstra com perfeição a confusão de uma pessoa que já está numa fase da vida que consegue compreender as consequências de seus atos, mas não consegue reagir a elas, e Milly Shapiro convence bastante como a pré-adolescente outcast que sente falta da avó.


Hereditário se mostrou mais uma excelente adição à nova safra de filmes de horror que vem surgindo. E apesar da ressalva, continua sendo um dos melhores filmes do ano e pode vir com força total na futura temporada de premiações, se não for ofuscado por outros títulos.

Não tome minha palavra como certa. Basta assistir e sentir.

Obrigatório para os fãs do gênero.

Por: Rennan Gardini

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